São Clemente faz carnaval de gente grande para brincar | Diário do Porto

São Clemente faz carnaval de gente grande para brincar

Conhecida pelo bom humor e irreverência, São Clemente teve “O conto do vigário” como enredo de 2020. O samba contou com o humorista Marcelo Adnet

Muitas cores e alegria no desfile da São Clemente (Foto: Gabriel Monteiro/Riotur)

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Os estudiosos do carnaval e os admiradores da São Clemente gostam de contar que essa escola de samba, uma das mais simpáticas do Rio, nasceu de uma brincadeira de jovens do bairro de Botafogo, jogadores de futebol. O time se chamava São Clemente Futebol Clube, em uma homenagem à rua, e o grupo estava prestes para viajar para um jogo no interior quando Ivo da Rocha Gomes avistou duas barricas vazias de uva na porta de uma quitanda. Viraram instrumentos de percussão de uma animada batucada. Era o ano de 1951.

Naquele momento Ivo decidiu criar um “bloco de sujo” para desfilar no Carnaval de Botafogo com as cores do time, azul e branca. Os primeiros ensaios foram no estacionamento de uma loja de autopeças na São Clemente, iluminados por gambiarras. João Marinho e Aílton Teixeira também ficaram conhecidos como fundadores da escola de samba. O primeiro desfile foi em 1952.  

Com a dedicação e a garra de muitos moradores do morro Dona Marta, a São Clemente desperta muita simpatia e empolgação quando desfila, mas sua melhor colocação no Grupo Especial do Carnaval foi o 6° lugar em 1990, com o enredo “E o samba sambou”. A São Clemente costuma apresentar desfiles com críticas bem humoradas.

Renatinho: na luta desde os 10 anos

A sede da São Clemente como instituição sempre esteve no bairro de Botafogo, mas a quadra para ensaios da escola está na Avenida Presidente Vargas, na fronteira do Porto Maravilha, quase em frente à sede da Prefeitura do Rio. Os enredos de natureza mais panfletária na década de 80 inspiraram a alcunha de “PT do samba”.

Um dos grandes nomes da escola é Renato de Almeida Gomes, filho do fundador. Renatinho, como é conhecido, participa ativamente dos desfiles da agremiação desde os dez anos de idade. Já participou da comissão de frente, da ala, foi diretor de bateria, batizada de “Bateria Fiel”, durante 17 carnavais, diretor de esporte e vice-presidente até chegar a presidência em 2002. Na sua gestão, iniciada em 2002, a escola conquistou três dos seus cinco títulos, em 2003, 2007 e 2010.

Reproduzimos aqui a letra o samba de 1952, de Nelson Escurinho, quando o bloco desfilou pela primeira vez:

São Clemente fez um desfile vibrante em 2018 (Foto: Fernando Grilli/Riotur)


Vamos cantar à melodia
Trazida do meu coração
Vamos esquecer a tristeza cruel da desilusão
Da melodia fiz um poema
Que canto nas noites de solidão
Eu era tão feliz

Vivia na maior desilusão
Hoje não me resta mais nada
Só existe no meu coração
E neste samba que é um poema
Que canto nas noites de solidão

O carnaval de 2020

A escola foi a primeira a desfilar no segundo dia de desfile, 24 de fevereiro, e apresentou o enredo “O Conto do Vigário“. Contou histórias de falcatruas desde a época da exploração de ouro em Minas Gerais, começando com a disputa de uma imagem por duas paróquias. Com uma visão irônica e bem humorada, o samba-enredo tem a composição do humorista Marcelo Adnet e de André Carvalho, Gabriel Machado, Pedro Machado, Gustavo Albuquerque, Camilo Jorge, Luiz Carlos França e Raphael Candela. Conheça o samba-enredo de 2020:

O sino toca na capela e anuncia

Nossa Senhora começou a confusão!

Quem vai ficar com a imagem de Maria?

O burro vai tomar a decisão

Mas o jogo estava armado

Era o conto do vigário

Nessa terra fértil de enredo

Se aprende desde cedo

Todo papo que se planta dá

Dom João deu uma volta em Napoleão,

Fez da colônia dos malandros capital

Trambique, patrimônio nacional

Tem laranja!

“Na minha mão, uma é três e três é dez!”

É o bilhete premiado vendido na rua

Malandro passando terreno na lua!

Hoje, o vigário de gravata

Abençoa a mamata,

Lobo em pele de cordeiro

“Trago em três dias seu amor”

“La garantia soy yo!”

“Só trabalho com dinheiro”

Chamou o VAR, tá grampeado,

Vazou, deu sururu,

Tem marajá puxando férias em Bangu!

Balança na rede

Abre a janela, aperta o coração

O filtro é fantasia da beleza

Na virtual roleta da desilusão

Brasil, compartilhou, viralizou, nem viu!

E o país inteiro assim sambou

“Caiu na fake news!”

Meu povo chegou ôô!

A maré vai virar, laiá!

Na ginga, pra frente, lá vem São Clemente

Sem medo de acreditar!