Olga de Mello
Escritores conhecidos e sempre citados nem sempre são muito lidos. O russo Liev Tolstói voltou no noticiário recente depois da indicação do violinista Lucas Lima, que comentou a leitura da novela A morte de Ivan Ilitch (Editora 34, RS 40). Em publicação no Instagram, Lima destacou o trecho em que o protagonista observa “Talvez eu não tenha vivido como deveria”, alguns dias antes do anúncio de sua separação da cantora Sandy. Foi o bastante para a história de um homem que reflete sobre a existência no fim da vida tornar-se o pivô do fim do casamento.
Apesar de ocupar algo em torno de 50 páginas, a leitura é densa. Lançada em 1886, quando Tolstoi estava com 58 anos e questionava o sistema social russo, a novela traz as observações do juiz de instrução Ivan Ilitch, casado com uma mulher frívola, pai de um casal de filhos fúteis como a mãe, todos inseridos numa sociedade de aparências. Diante da morte iminente, ele questiona a vida que levou — o que acontecia também com o escritor, que vivia seu próprio inferno conjugal depois de defender ideias de uma sociedade mais igualitária, quase anarquistas. A recomendação de Lucas Lima pode trazer novos leitores para o clássico russo, autor dos geniais calhamaços Guerra e Paz e Anna Karenina, um mestre da literatura mundial.
Às vésperas de tornar-se best-seller entre o público brasileiro, o pouco conhecido por essas bandas Jon Fosse é o quarto norueguês a ganhar um Nobel de Literatura. Tem uma extensa obra teatral, romances e até livros infantis, traduzidos para mais de 40 idiomas. Segundo o Comitê Nobel, que acaba de lhe conceder o prêmio, a escolha deve-se à combinação de “fortes laços locais, tanto linguísticos como geográficos, com técnicas artísticas modernistas”, “calor e humor” e uma “vulnerabilidade ingênua às suas imagens nítidas de experiência humana”.
Diferentemente de Tolstoi, de redação claro e convencional, Fosse não obedece a uma pontuação ou divisão em parágrafos (menos ainda em capítulos) tradicionais. Para azar dos tradutores, ele escreve em nynorsk (neonorueguês), a variante linguística criada no século XIX, falada por apenas 10% dos noruegueses, mas um dos idiomas oficiais do país. Para Fosse, o Nobel foi um reconhecimento do nynorsk, que surgiu como alternativa ao uso dominante do dinamarquês. Jon Fosse costuma dizer que escrever “é ouvir, é um ato mais musical do que intelectual”, criou um estilo conhecido como o ‘minimalismo Fosse’, com frases e sequências longas, ausência de pontos finais e quebra de regras no uso da vírgula.
No Brasil, há apenas dois livros seus lançados, Melancolia (Tordesilhas, esgotado), romance sobre um personagem real, o pintor Lars Hertevig, e É a Ales (Companhia das Letras, R$ 64,90), que conta a história de uma mulher cujo marido saiu de barco vinte anos antes sem nunca voltar para casa. Este mês, chega às livrarias brasileiras Brancura (Fósforo, R$ 59,90), em que um homem se aventura de carro por uma mata escura onde encontra um ser reluzente. Novas obras de Fosse devem sair no país no próximo ano.