Reportagem de Larissa Guimarães
No segundo dia do Fórum de Finanças Climáticas e de Natureza (FFCN), realizado nesta terça-feira (27), no Rio, lideranças nacionais e internacionais participaram de uma série de painéis e mesas redondas que abordaram os principais desafios e estratégias para viabilizar a transição para uma economia de baixo carbono, com justiça social, inovação financeira e protagonismo das populações. As discussões fazem parte da preparação do Brasil para sediar a COP30, em novembro de 2025, em Belém (PA).
Na abertura, o presidente da COP30, embaixador André Aranha Corrêa do Lago, falou sobre o papel do Estado e da iniciativa privada na transição para uma economia justa e de baixo carbono, abordando a necessidade de destravar investimentos estratégicos. Segundo o embaixador, uma das principais frentes da COP30 é o esforço para consolidar um “roadmap” que viabilize a mobilização de US$ 1,3 trilhão por ano até 2035. “Esse número assusta, mas precisamos ser dinâmicos e inovadores. O financiamento sempre foi uma dificuldade, desde a Rio92”, afirmou o embaixador da COP30. Para avançar neste desafio, foi criado um grupo de economistas e o Círculo de Ministros da Fazenda, encabeçado por Fernando Haddad, para integrar ministros de finanças de diferentes países ao debate, lembrou o presidente da COP30. “Não basta negociar clima, é preciso que os ministérios responsáveis pela implementação estejam engajados. O Brasil tem dado exemplo, ao apresentar suas NDCs (metas climáticas) como plano de desenvolvimento”, disse ele em sua participação no FFCN.
Na sequência, no painel “O Papel do Estado na Transição para uma Economia Justa e de Baixo Carbono”, líderes de diferentes setores se reuniram para discutir como desbloquear investimentos públicos e privados em setores verdes estratégicos, a exemplo de minerais críticos, agricultura regenerativa, alinhando-os à transição para uma economia de baixo carbono. Participaram do debate, organizado pela Open Society Foundations (OSF), Adauto Modesto Júnior, secretário-executivo adjunto do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos; Lígia Pinto, vice-presidente de Relações Governamentais e Institucionais da Sigma Lithium; Yin Shao Long; diretor adjunto de Pesquisa do Instituto Khazana; Adriana Abdenur, co-presidente do Fundo Global para uma Nova Economia; e Amir Labdioui, diretor do Centro de Tecnologia e Industrialização para o Desenvolvimento da Universidade de Oxford. Para Pedro Abramovay, vice-presidente global de Programas da OSF, o painel tratou de um tema essencial que será levado à COP30.
“O papel do Estado na transição para uma economia justa e de baixo carbono é um tema de debate absolutamente crucial, especialmente para quem tem uma visão democrática sobre o que significa transição climática. Muitas vezes, o tema é abordado como se a questão fosse apenas a quantidade de recursos necessários, mas esses recursos por si só não são capazes de aterrissar e imediatamente transformar o planeta. A capacidade de converter recursos em bens públicos e bem-viver depende principalmente do Estado, por isso, é fundamental discutir soluções climáticas reconhecendo e mantendo o Estado nesse papel central de responsabilidade”, destacou Abramovay.
O segundo painel, “Mobilização de Capital Privado para a Transição do Clima e da Natureza”, foi organizado pelo Instituto Arapyaú, Instituto AYA, Instituto Clima e Sociedade (iCS), Instituto Igarapé, Instituto Itaúsa, Open Society Foundations (OSF) e Uma Concertação pela Amazônia. Participaram como debatedores Luciana Ribeiro, sócia fundadora e CEO da eB Capital; Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS); e Ricardo Mussa, presidente da SB COP30, iniciativa liderada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria). Este painel discutiu caminhos da mobilização de capital privado para superar barreiras de risco e ampliar investimentos em setores estratégicos. A conversa destacou o papel de instrumentos financeiros inovadores, políticas públicas eficazes e parcerias entre governos, setor privado e instituições multilaterais.
O FFCN seguiu com o terceiro painel do dia, “Fomento à Sociobioeconomia da Amazônia: integrando a diversidade para ampliar o impacto de mulheres indígenas”. Os painelistas foram Braulina Baniwa, integrante da Articulação Brasileira de Indígenas Antropólogos (Abia) e da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga); Francisco De Filippo, assessor internacional do Ministério dos Povos Indígenas; Marcyely Ayap Tupari, coordenadora secretária da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab); Ellen Cristina Acioli, especialista em Amazônia do Banco Inter-Americano de Desenvolvimento (BID); e Cassiane Lopes, gerente de Soluções em Bioeconomia no Banco do Brasil. Organizado pela Uma Concertação pela Amazônia, o painel debateu caminhos para fortalecer o financiamento à sociobioeconomia na Amazônia Legal, com foco na valorização do protagonismo de mulheres indígenas. A discussão reuniu experiências diversas para identificar mecanismos institucionais eficazes, analisar casos práticos e apontar gargalos e soluções para ampliar o impacto do financiamento. “Investir na bioeconomia indígena feminina da Amazônia é essencial para amplificar sistemas econômicos inclusivos e sustentáveis baseados na natureza. Se a Amazônia é reconhecida por sua diversidade, não poderia ser diferente com suas economias – e é parte dessa pluralidade que estamos aqui para escutar e fortalecer”, defendeu Georgia Jordão, responsável pela frente de Conhecimento da rede Uma Concertação pela Amazônia e mediadora do painel.
O quarto painel, “Destravando Investimentos Privados para a Bioeconomia, Restauração e Agricultura Regenerativa: o Caminho até a COP30”, tratou da coalizão de Finanças para a Restauração e Bioeconomia do Brasil, iniciativa que reúne líderes dos setores público e privado com o objetivo de mobilizar US$ 10 bilhões até 2030. Este painel, organizado pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), teve a participação de Marina Cançado, fundadora da Converge Capital e da Ato; Karen Oliveira, diretora de Políticas Públicas & Assuntos Governamentais na TNC; Gabriel Azevedo, diretor-geral de ESG na IDB Invest; Danielle Carreira, líder de Engajamento para Setor Financeiro no World Economic Forum (WEF); e Alessandra Fajardo, conselheira sênior para a COP30 e Integração Estratégica no Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). A discussão mostrou os avanços da Coalizão, estudos em andamento e contribuições atuais dos seus integrantes, além de estimular a vinda de novos participantes comprometidos com investimentos em restauração e bioeconomia. Gabriel chamou atenção para os principais gargalos que ainda limitam a entrada de capital privado nesse campo. “Há proponentes em várias escalas, mas poucos projetos atingem o grau necessário para atrair capital. Seja pela estruturação financeira ou pela governança, ainda falta alcançar um padrão mínimo. A missão nobre por si só não move o investidor. Precisamos de rentabilidade e de endereçar os riscos”, afirmou.
Os debates seguiram com o quinto painel abordando a questão “Como navegar e ampliar os Investimentos globais e os fluxos comerciais para cadeias de valor produtivas de baixo carbono?”. Organizado pelo Instituto AYA, teve a participação de Gabriela Dorlhiac, presidente Brasil do International Chamber of Commerce (ICC); Luciana Costa, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); Luciana Ribeiro, sócia-fundadora e CEO da eB Capital; Sergio Suchodolski, pesquisador sênior no Instituto Milken – Enviado Especial para o Finance in Common; Carolina Grottera, diretora de Programa da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda do Brasil. O debate discorreu sobre o papel do Brasil como exportador estratégico de soluções verdes e as oportunidades de investimento em cadeias de valor de baixo carbono.
Dando sequência, no sexto painel, organizado pelo Instituto Itaúsa, o tema foi “Produtividade e Sustentabilidade: um Novo Paradigma para a Economia”, discutindo como a integração entre produtividade e sustentabilidade pode oferecer respostas estratégicas a desafios globais como baixo crescimento, desigualdade e crise climática. Participaram Annelise Vendramini, professora de Doutorado na Fundação Getúlio Vargas (FGV); Juliano Assunção, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio e diretor executivo do CPI/PUC-Rio; Izabella Teixeira; ex-ministra do Meio Ambiente do Brasil e copresidente do Painel Internacional de Recursos (PNUMA); Morgan Doyle, gerente-geral, Departamento de Países do Cone Sul do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); e Lucas Grilo, gerente técnico de Clima, Energia e Finanças Sustentáveis no CEBDS. Os debatedores exploraram caminhos para ganhos de eficiência compatíveis com uma economia de baixo carbono a partir de investimentos em uso da terra, transições energéticas e sistemas urbanos, além de políticas públicas, reformas institucionais e métricas alternativas ao PIB.
O tema “Finanças Inovadoras para Florestas e Biomas Tropicais” foi debatido no sétimo painel, organizado pelo Instituto Igarapé, com a participação de André Aquino, assessor especial para Economia e Meio Ambiente no Ministério do Meio Ambiente do Brasil (MMA); Mariana Sarmiento, fundadora e CEO da Terrasos; Luciana Costa, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do BNDES, e Tony Lent, cofundador da Capital for Climate. Os especialistas discorreram sobre soluções financeiras voltadas à conservação e ao uso sustentável de florestas e biomas tropicais, destacando mecanismos inovadores capazes de posicionar a natureza como ativo e impulsionar cadeias de valor. Ilona Szabó, presidente do Instituto Igarapé, destacou a importância dos temas discutidos no debate. “Precisamos manter um olhar criterioso para a criação de novos ecossistemas de mercado, e buscar sistemas justos e verdes que sejam compatíveis com as florestas e com benefícios, principalmente, para os que vivem nela. Só assim vamos fazer frente às mudanças do clima. No Igarapé, trabalhamos em três frentes: segurança, natureza e clima. Nós identificamos as economias ilícitas e que desafios trazem, valorizamos o fortalecimento de políticas públicas e precisamos avançar rumo a mecanismos inovadores. Nosso ouro verde é a biodiversidade. Sem ela, não há segurança alimentar ou energética, nem bem-estar para todos”, afirmou Ilona.
O último painel do II FFCN, “Aumentando a escala de Soluções Baseadas na Natureza (SbN) para a ação climática: como destravar o potencial da restauração de florestas tropicais”, foi organizado pelo Instituto Arapyaú. Esta mesa abordou formas para ampliar a restauração de florestas tropicais, como solução baseada na natureza para mitigação, adaptação e resiliência climáticas. Falaram Viviane Kwon, co-líder de Inovação Sustentável no Banco Santander Brasil; Beatriz Lutz, gestora do fundo de reflorestamento na Pátria Investimentos; Fernando Visser, diretor de Desenvolvimento de Negócios e Tecnologia na Re.green; Plínio Ribeiro, cofundador e CEO da Biofilica Ambipar Environment S.A; e Katerina Elias-Trostmann, diretora para América Latina, Clima e Natureza na Salesforce. Foram debatidos o potencial do Brasil, os desafios técnicos e financeiros e as oportunidades de consolidar a restauração como classe de ativo estratégica.
O FFCN é organizado por sete instituições da sociedade civil — Instituto Arapyaú, Instituto AYA, Instituto Clima e Sociedade (iCS), Instituto Igarapé, Instituto Itaúsa, Open Society Foundations e Uma Concertação pela Amazônia. Em sua segunda edição, o evento se consolidou como espaço de articulação entre diferentes setores na construção de uma agenda climática mais ambiciosa, inclusiva e financeiramente viável.