Galeão / Artigo
Em 2004, o aeroporto internacional do Galeão alcançou cerca de 5 milhões de passageiros por ano, enquanto o Santos Dumont chegou a 5,5 milhões. Essa havia sido a primeira vez em que a situação entre os dois se invertia. O Governo do Rio percebeu logo a ameaça que isso significava para a economia do Estado e pressionou, com determinação, o Governo Federal, conseguindo a limitação do Santos Dumont e a transferência de voos para o Galeão.
A ameaça era clara. O Galeão estava perdendo a condição de hub aéreo, o que afetava o fluxo direto de passageiros para o Rio, com consequências para vários setores econômicos, principalmente para toda a cadeia produtiva do turismo, e para as operações de importação e exportação, via aviões. Ou seja, parece que hoje vivemos uma reprise na Sessão da Tarde. O Governo do Rio não vacilou e exigiu que os voos no Santos Dumont fossem limitados às linhas para São Paulo, para o interior do Estado e para jatinhos.
A governadora era Rosinha Garotinho, que falou diretamente com Lula, o então presidente da República em primeiro mandato. Cabia, e ainda cabe, ao Governo Federal regular as operações de voos entre os aeroportos. Com a pressão de Rosinha, o Santos Dumont foi limitado e o Galeão recebeu as linhas nacionais que passaram a trazer mais passageiros para conexões a voos internacionais.
A mudança logo deu resultados, conta Delmo Pinho, atual assessor da Presidência da Fecomércio e que, na época, integrava a equipe de Rosinha. Durante muito tempo, por exemplo, os voos que partiam do Rio para Paris tinham 60% dos passageiros vindos em conexões de outros Estados. Tudo funcionou perfeitamente até que, em 2009, já com o Rio sob o comando de Sérgio Cabral, o Governo do Estado aceitou as pressões para que novamente não houvesse regulação entre os dois aeroportos, permitindo que as empresas aéreas operassem onde quisessem.
Naquele tempo, o Brasil vivia a felicidade do pleno emprego, do crescimento econômico contínuo, os aeroportos do país estavam, pela primeira vez, ocupados por todas as classes sociais. Então, pouca gente deu muita importância para o retorno da competição do Santos Dumont contra o Galeão. Havia mercado para os dois. Essa é a política pública que vigora até hoje e o resultado todos sabemos quais são.
O esvaziamento do Galeão não é simples consequência da decadência econômica do Rio. É, antes de tudo, um fator agravante desse processo. Para sair dessa situação, é preciso acabar com essa política pública contrária aos interesses do Estado.
E soa até anedótico ouvir as propostas do atual Governo Federal, que, diante dos pedidos para novamente regular os voos e salvar o Galeão, quer fazer exigências. Ora, não há o que exigir. Há o que fazer. Primeiro limitar o Santos Dumont, não aos atuais 9 milhões de passageiros anuais, mas para no máximo 6 milhões e transferir as demais linhas para o Galeão. Ao mesmo tempo é que vêm as obrigações da Prefeitura e do Governo estadual, que já deveriam estar trabalhando, mas isso é assunto para outro artigo.
E não vale dizer que regular os voos entre o Santos Dumont e o Galeão fere o direito das empresas aéreas ou de concessionários de aeroportos de outros Estados. O direito da sociedade sempre se sobrepõe aos interesses privados.
*Editor do DIÁRIO DO PORTO