Sabor, aventura, vinho e charme na Vila de Secretário | Diário do Porto


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Sabor, aventura, vinho e charme na Vila de Secretário

Consolidada como destino de turismo sofisticado, a Vila de Secretário, em Petrópolis, se equilibra entre preços em alta e muita simplicidade

25 de janeiro de 2023

O clima ameno ressalta as belezas da natureza na Vila de Secretário (Fotos de Alaor Filho)

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Aziz Filho e Eliane Lobato

No meio do caminho, há uma pedra, duas, muitas pedras. O trecho da Estrada Real que liga Petrópolis a Paraíba do Sul é sinuoso e cheio de buracos. Parece até que o governo não dá muita bola para o lugar, como na época em que a Família Real, lá de Portugal, mandava em tudo por aqui. Mas, de repente, no meio do caminho, tem uma bela escola, um agradável haras e até uma vinícola com jeitão de Provence. Assim é a Vila de Secretário, um recanto da cidade imperial de Petrópolis que vem se tornando paradeiro de pessoas que gostam de paz, vinhos, queijos, cavalos, bicicletas, cachoeiras e … Estrada Real, com direito a pedras e buracos.

Falando assim, pode parecer cansativo, mas nada cansa na Vila de Secretário, muito menos a vista. São montanhas que não acabam mais, como a Maria Comprida, para os lados de Araras.

Estrada na Vila de Secretário
Na Vila de Secretário, a simplicidade é o caminho

Este é o cenário convidativo para um mercado imobiliário que tem crescido muito, com preços cada vez mais elevados de terrenos e casas em condomínios disputados. Os artistas de TV que buscam refúgio por ali contribuem para a curva ascendente dos preços dos imóveis e para o ambiente glamouroso nas ruelas, estradas sinuosas de terra batida, riachos, pastos e cachoeiras.  

Caminho da Roça

O nome Secretário vem do século XVIII porque era a sesmaria do secretário da Câmara da Capitania do Rio de Janeiro, que tinha a missão de conservar o caminho que ligava Minas ao Rio e combater assaltos e contrabandos de tropeiros em busca de fortunas.

O tempo mudou, mas na Vila de Secretário ele ainda demora para passar. Para quem chega da cidade grande, uma boa dica para ajustar o fuso horário à paz de Secretário é dar uma paradinha no Instituto Caminho da Roça. Enquanto o café escorre do pequeno coador na mesa direto para a xícara, o visitante confere o trabalho de preservação e educação do instituto, uma entidade sem fins lucrativos. Mais de 100 alunos estão nas aulas de violão, teclado, piano, canto, coral, sanfona, capoeira e educação ambiental.

Os diretores são Janice Caetano e Alaor Filho, um casal de jornalistas do Rio de Janeiro que fincou raizes na Vila há 25 anos. As fotos que ilustram esta reportagem são de Alaor, que teve uma carreira de destaque em jornais de circulação nacional. Além de se dedicarem aos projetos comunitários, ele e Janice são produtores rurais e cultivam cogumelos.

“Criamos uma relação muito forte com Secretário, tanto que decidimos não só ter um sítio, mas morar e também construir um legado social e ambiental por meio do Instituto”, diz Janice. O Instituto Caminho da Roça é fruto do festival Agrosserra, que reúne produtores rurais da região, todos apaixonados pelo meio ambiente. Tudo é muito simples na vila, e aí está a graça.

As tentações do Sítio Humaytá

A simplicidade é o segredo de sucesso de empreendimentos como o Sítio Humaytá, a 7 quilômetros do centro da Vila. O sítio é uma das muitas estrelas gastronômicas que podem ser visitadas nos arredores, um paraíso de geleias, doces, compotas, molhos, chutney e antepastos. A sede dessa perdição imperdível, com perdão do trocadilho, é uma casa de fazenda, dessas em que a gente fica na varanda, deitado na rede, vendo o tempo não passar.

Mas a calmaria é só para o visitante. O pessoal do Sítio Humaytá trabalha duro há mais de 30 anos, quando os sócios Zé Adolfo e Gilson Gomes decidiram resgatar as receitas de doces de família que estavam se perdendo no tempo. Aquelas que só a vovó sabia fazer e guardar no vidro para ir saboreando aos poucos. O sítio tem apenas oito funcionários fabricando produtos para delicatessens, chefes de cozinha renomados e restaurantes sofisticados como o do Hotel Copacabana Palace.

 

Flores entre montanhas da Vila de Secretário
A variedade de cores enche de surpresas as paisagens da vila

 

Zé Adolfo, que veio do Rio Grande do Sul para embarcar nessa aventura de sucesso nas montanhas fluminenses, explica que muitos ingredientes são cultivados no sítio, outros comprados dos produtores locais, mas frutas como morangos, amoras e framboesas vêm do Chile. Quer uma dica? Anote aí duas: geleia de café, do chef Danio Braga, do grupo Fasano; e a geleia de frutas vermelhas inteiras.

 


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Hoje o Humaytá tem 62 produtos, mas os campeões de audiência ainda são os que chegaram primeiro: doce de leite e ambrosia. “Não tem jeito. As pessoas têm uma ligação consistente da infância com esses doces, é algo inesquecível e incomparável”, diz Zé Adolfo. São 30 mil potes por mês, em média, que saem de Secretário para vários lugares do Brasil.

Cavalgadas e vinícola

Para chegar ao Sítio Humaytá, você sai da Estrada Real e roda sete quilômetros. Ao voltar, repare no prédio da Escola Municipal Doutor Barros Franco. É de 1896. Poderia estar com a preservação mais bem cuidada, como infelizmente é o caso de grande parte das construções de séculos passados no Rio e no Brasil. Mas ainda assim é um prédio admirável.

Dali, a dica é seguir na direção de Sebollas, em Paraíba do Sul. É preciso ir devagar porque, mais uma vez, há pedras e buracos no meio do caminho. E muitas cenas de um tempo que parou, como as cavalgadas da Estrada Real. Muitos fazem o percurso em bicicletas. Além de pedras, há cachoeiras no caminho. As cavalgadas e pedaladas podem ser feitas em grupos organizados por pequenas empresas de turismo.  

 

Cachoeira em Secretário
Cachoeira na Vila de Secretário

 

Seguindo as placas da Estrada Real, nas quais se vê a coroa do Império, chegamos à primeira vinícola do Estado do Rio de Janeiro. Já estamos no município de Paraíba do Sul, mas a apenas 6 quilômetros da Vila de Secretário. É a Vinícola Inconfidência, onde há 22 mil mudas com variedades de uvas: Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Syrah e Sauvignon Blanc. Uma façanha e tanto, que o produtor José Cláudio Aranha conta ter começado nas viagens que ele fazia pelo mundo. 

Atraindo turistas

“A gente viajava muito, e em todos os lugares incríveis do mundo via plantações de uva. Não dava para entender por que não se poderia plantar aqui, onde temos altitude e temperaturas baixas no inverno”, recorda ele. Depois de muita pesquisa e 10 anos de preparação, em 2019, os primeiros vinhos do Rio de Janeiro foram engarrafados e rotulados em Secretário. A qualidade da bebida já foi comprovada por vários especialistas. No rótulo, um nome que tem tudo a ver com as histórias da Estrada Real, por onde o herói inconfidente Tiradentes circulou no século 18.

Montanhas em Secretário
Grandes montanhas emolduram a Vila de Secretário

Logo adiante, no condomínio rural Reserva das Ruínas, fica a Real das Ruínas, uma vinícola boutique, criada em 2017 às margens da Ruína do Entreposto. Trata-se de uma construção do século 18 para controlar o transporte as margens da Estrada Real e que também funcionou como prisão, venda e estalagem. O Entreposto compõe o conjunto de Ruínas da Pampulha, tombado em 2021 pelo Iphan.

O engenheiro florestal Victor Satiro de Medeiros diz que a vinícola no condomínio rural é “a proposta de um grupo de amigos, amantes de vinho, de ajudar na consolidação da região como hub de viticultura do Estado, aliando preservação histórica e desenvolvimento para a região.” A primeira safra saiu em 2022, formada por um corte com as uvas Malbec/Tannat/Merlot, além de outro rótulo exclusivo da uva Syrah,  com boa produtividade na região.

 

Vinícola Real das Ruínas
Victor Satiro de Medeiros na vinícola Real das Ruínas, às margens da Estrada Real (Foto pessoal)

André Luiz Gonçalves dos Santos, consultor de vários empreendedores que estão entrando no mundo das uvas e dos vinhos em Secretário, ressalta algumas condições que têm levado outras pessoas a se inspirar na Inconfidência para plantar videiras: “clima temperado, quente de dia e ameno à noite; solo mais argiloso, que retém a água e reduz gasto com irrigação; e, não menos importante, o charme de Secretário.”  

Secretário fica muito pertinho da ótima rede hoteleira da cidade imperial. É possível se hospedar em Petrópolis e visitar muitas atrações na vila. O Hotel Sesc Nogueira fica a 21 quilômetros, em uma área de 150 mil metros quadrados entre montanhas, com infraestrutura de lazer e até trilha ecológica. Por falar em aventuras, uma dica de empresa com bons guias da região é a Ecotur Experience Adventure Park. Visite também o site do Galpão Caipira, um ponto de gastronomia, apoio ao ciclismo, spa e charme bem no centrinho da Vila de Secretário. Por fim, anote o telefone da Associação de Guias de Turismo de Petrópolis: (24) 98842-3235. E boa viagem!

  • Texto baseado em roteiro da Avenida Comunicação para o projeto SESC RJ na Estrada.