Não é fácil a tarefa do genial carnavalesco Paulo Barros, que está à frente do desfile da Paraíso do Tuiuti no Carnaval 2022 com o enredo Ka ríba tí ÿe – Que nossos caminhos se abram, sobre a resistência dos negros. A escola ainda tem o gostinho do vice-campeonato de 2018, quando arrebatou o Sambódromo com um desfile de alta acidez política sobre os 130 anos da Lei Áurea.
Naquele ano, o enredo “Meu Deus! Meu Deus! Está extinta a escravidão?“, o Paraíso do Tuiuti recontou a história da escravidão no Brasil. Era o 130º aniversário da Lei Áurea. E fez uma denúncia do racismo e das dificuldades dos trabalhadores brasileiros, colocando o então presidente Michel Temer em uma alegoria de vampiros.
Em 2019, outro enredo político e crítico, sobre o Bode Ioiô, rendeu o oitavo lugar e o Estandarte de Ouro, do jornal O Globo, como melhor enredo. A extrema direita esteve na mira do desfile, ao ponto de uma ala mostrar coxinhas armadas, crítica direta ao discurso do presidente Jair Bolsonaro. No último carro, frases aludiam a falas do presidente e seus aliados, como “Deus acima de tudo, mas a favor da tortura”.
O Santo e o Rei
No último desfile, 2020, o susto de quase ter sido rebaixada: 11º lugar. para o enredo “O santo e o rei”, do carnavalesco João Vítor Araújo, que mostrou um encontro de Dom Sebastião, rei de Portugal, com São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro.
Paulo Barros agora aposta todas as fichas, mais uma vez, na ligação da escola com a história dos negros. O enredo trata de luta, sabedoria e resistência dos descendentes da África. Ka ríba tí ÿe vai exaltar a contribuição de grandes figuras negras para a humanidade e levar ao Sambódromo uma perspectiva futurista da negritude.

O desfile do Paraíso do Tuiuti passa, entre outros, por Barack Obama, Nelson Mandela e Catherine Johnson, uma das responsáveis por colocar o homem em órbita da Terra. Esses herois da vida real vão estar vinculados, no Sambódromo de Paulo Barros, às figuras do candomblé, como Xangô.
O enredo falará da importância de quebrar barreiras e estereótipos, como Obama fez ao se tornar o primeiro presidente negro da nação mais poderosa do planeta.
História da Paraíso do Tuiuti
A história da Paraíso do Tuiuti remonta à década de 1930, mas a Unidos do Tuiuti desapareceu após a Segunda Guerra Mundial para dar lugar ao Bloco dos Brotinhos. Até que um grupo de sambistas se reuniu, terminou com o bloco e com a Paraíso das Baianas e fundou, em 5 de abril de 1954, a Paraíso do Tuiuti, com as cores amarelo (herdado da Paraíso das Baianas) e azul (herdado da Unidos do Tuiuti).
Em 1968, com o enredo de Júlio Matos homenageando o bairro de São Cristóvão, a Paraíso do Tuiuti tira o primeiro lugar no Grupo 3 e vai para o Grupo 2. O fato é que, até o início da década de 1980, quase ninguém de fora da região ouviu falar da escola.
Você pode ouvir o samba aqui. Confira a letra abaixo:
Ka ríba tí ÿe – Que nossos caminhos se abram
Alô, meu Tuiuti!
Quem for contra, vai chorar
Porque, se Deus é por nós
Quem será contra nós?
Abriu a porta da senzala!
É pegada de africano, hein?
Ogunhiê! Okê arô!
Laroyê! Meu pai, kaô
Tem sangue nobre de Mandela e de Zumbi
Nas veias do povo preto do meu Tuiuti
Ogunhiê! Okê arô!
Laroyê! Meu pai, kaô
Tem sangue nobre de Mandela e de Zumbi
Nas veias do povo preto do meu Tuiuti
Olodumarê mandou
Oxalá me conduzir
Pelo céu da liberdade
Me falou Orunmilá
Vai, meu filho, semear, pelo mundo, a humanidade
Nos caminhos de Exu
Me perdendo, eu encontrei, nua e crua, essa verdade
Que a raiz do preconceito
Nasce do olhar estreito da cruel desigualdade
Sou alabê gungunando o tambor
Trago cantos de dor, de guerra e de paz
Pra ver secar todo pranto nagô
E gritar por direitos iguais
Meu sangue negro que escorre no jornal
Inundou um oceano até a Pedra do Sal
É! Dandara!
A espada e a palavra, é!
Não vai ser escrava, é!
De ver noutras negras minas
Um baobá malê que nasceu do chão
Pra vencer a opressão
Com a força da melanina
É! Dandara!
A espada e a palavra, é!
Não vai ser escrava, é!
De ver noutras negras minas
Um baobá malê que nasceu do chão
Pra vencer a opressão
Com a força da melanina
Negro é cultura e saber
Ka Ríba Tí Yê, caminhos de Sol
Onde Mercedes, Estelas
Por becos e vielas
Se fazem farol
Pra iluminar Alafins
E morrer só de rir, feito mil Benjamins
E cantar! Cantar! Cantar
A beleza retinta que veio de lá
E cantar! Cantar! Cantar
Pra saudar o meu Orixá