Eliane Lobato
São duas histórias diferentes e igualmente importantes, a da casa e a da mulher que dá nome à edificação da Casa de Cultura Heloísa Alberto Torres. O belo sobrado no Centro Histórico de Itaboraí, a apenas 45 quilômetros do Rio de Janeiro, é uma autêntica representação da arquitetura urbana brasileira do século 19. Construído há 212 anos, é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
A Casa de Cultura é um casarão com pé direito de quatro metros, sete janelas frontais – cinco no andar de cima e duas no primeiro piso – e uma porta de entrada de três metros de altura. Difícil passar na calçada e não se sentir atraído a entrar nessa construção histórica. Ou, pelo menos, dar uma espiada nas obras expostas no hall.
Dona Heloísa e a ciência
Nela morou Heloisa Alberto Torres, ou Dona Heloisa, como era conhecida. Ela nasceu em 1895 e viveu 82 anos. A instituição seguiu a vocação da antiga proprietária, sempre envolvida com a ciência, nas áreas de antropologia, arqueologia e etnologia, e no campo cultural.
O pai de Heloísa é o político e jurista Alberto Torres (1865-1917), governador do Rio de Janeiro e ministro do Supremo Tribunal Federal. Por sua vez, ela foi a primeira mulher a dirigir o Museu Nacional (de 1938 a 1955) e uma das fundadoras dos órgãos que deram origem ao Iphan e à Funai.
O sobrado foi comprado na década de 1960 para abrigar o acervo da família, que está nele até hoje. Entre as raridades, há a biblioteca de sete mil livros, o mobiliário de época e imagens religiosas. Uma delas é o “santo do pau oco”, uma escultura de Santo Antônio com uma parte oca para esconder valores em geral. A expressão acabou se popularizando para designar pessoas falsas.
Uma mulher à frente de seu tempo
No piso inferior ficam objetos antigos, como pilões para moer café ou farinha, uma pedra de fundação da cidade com o brasão português e muitas obras de arte, além de um extraordinário acervo documental que está sendo restaurado, higienizado e digitalizado. O antigo e o novo convivem harmoniosamente no espaço, com várias mostras de artistas locais ou nacionais.
Heloísa é o que se costuma classificar como “à frente de seu tempo”. Ela trabalhou pelo patrimônio histórico e com políticas públicas indigenistas entre as décadas de 30 e 60. Parecia adivinhar o que estava por vir e batalhou para que o indígena fosse o protagonista de sua preservação. “Em que não lhes será imposto nenhum sistema econômico estranho, mas através do qual procurar-se-á os indivíduos para a liderança e obter desses líderes que indiquem o que desejam fazer”, como escreveu.
Cerâmicas marajoaras
Infelizmente, não foi o que aconteceu. Mas Heloísa sabia que o “espírito desenvolvimentista” ameaçava comunidades indígenas com a ocupação da Amazônia, o garimpo e a extração de madeira.
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Seu estudo antropológico de cerâmicas marajoaras é reconhecido internacionalmente, e a Casa de Cultura exibe, na entrada, belos vasos de cerâmica com motivos marajoaras produzidos em Itaboraí. Os artesãos mantêm viva a tradição milenar da olaria com traçado geométrico, que teve origem na ilha de Marajó.
Um dos destaques é a cerâmica doada pelo artista plástico e oleiro Og Sales, o Bumba Meu Boi, que retrata a figura humana sob o manto do Boi-Bumbá. Og Sales era baiano, mas escolheu viver em Itaboraí e expôs também fora do Brasil.
Atrações da Praça Marechal Floriano Peixoto
A Casa de Cultura Heloísa Alberto Torres fica na Praça Marechal Floriano Peixoto, no centro histórico de Itaboraí, onde outras belezas arquitetônicas valem – e muito – várias selfies. A mais importante é a Matriz de São João, uma belíssima igreja de torre única tombada pelo Iphan. A primeira capela foi feita em 1684, e deu origem à cidade. Ela foi reconstruída entre 1725 e 1742.
A Prefeitura fica no Palacete Visconde de Itaboraí, também tombado pelo Iphan, do fim do século 18. Na praça ficam também o Teatro João Caetano de Itaboraí, de 1827, e a Casa de Câmara e Cadeia Pública, de 1840, onde funciona a Câmara de Vereadores.
São todos sinais do passado glorioso de uma cidade que, com o Complexo Petroquímico, passou a sonhar com o futuro.
Serviço
Casa de Cultura Heloísa Alberto Torres
Endereço: Praça Mal. Floriano Peixoto, 305 – Centro.
Contatos: Visitas devem ser agendadas previamente, individuais ou em grupo com, no máximo, cinco pessoas – (21) 2635-4291
- Baseado em roteiro da Avenida Comunicação para o projeto SESC RJ na Estrada